sábado, 19 de fevereiro de 2011

ElBaradei descobriu só agora que os militares deram um autogolpe…


Por Marcelo Ninio, na Folha:
Considerado por muitos como um dos pais da revolução que derrubou o ditador Hosni Mubarak, o Nobel da Paz Mohamed ElBaradei, 68, está apreensivo com a transição em andamento no país.
Em entrevista à Folha no escritório de sua ampla casa num condomínio de luxo na periferia do Cairo, ElBaradei disse que os sinais emitidos pela junta militar que assumiu o governo do Egito não são tranquilizadores.
Ele criticou o Brasil pela política de não criticar ditaduras como a de Mubarak em nome da não intervenção e da solidariedade com países em desenvolvimento.
Folha - Na última quinta-feira, depois que Mubarak disse que não renunciaria, o sr. alertou que o Egito iria “explodir”. Horas depois, ele deixou o poder. O que levou a uma mudança tão rápida?
Mohamed ElBaradei -
Ele tentou de tudo para ficar no poder. Mas a saída de Mubarak virou uma obsessão para os egípcios. Quando o Egito inteiro estava nas ruas na sexta, escrevi no Twitter que o Exército deveria intervir, porque o país estava indo pelo ralo. Por sorte os militares assumiram o controle.
O Exército, base do regime, continua no poder. O regime caiu mesmo?
Esta ainda é uma questão inteiramente aberta, que me deixa apreensivo. Queríamos o Exército para salvar o país e evitar uma guerra civil, mas não como ponte entre a ditadura e a democracia. As medidas que poderiam restaurar a credibilidade imediatamente são a revogação da lei de emergência, a liberdade para estabelecer partidos e a libertação dos prisioneiros políticos. A esta altura, no mínimo deveríamos ter um governo compartilhado entre militares e civis. Ouvir que o Exército governará o país sozinho nos próximos meses, sem Constituição e sem Parlamento, não é tranquilizador.
O período de transição deveria ser mais longo?
Acho que precisamos de no mínimo um ano para dar às pessoas o direito de estabelecer partidos, de se engajar. O pior é que ainda estamos com o governo Mubarak e a junta não se comunica com o povo.
Houve um encontro de generais com jovens líderes, isso não é um bom começo?
Os jovens deflagraram a revolução, mas administrá-la é algo diferente. Se os militares reduzirem o processo aos jovens, estarão abortando a revolução. Percebi a mesma apreensão em muitas pessoas. Como se o comando militar fosse uma reencarnação do regime Mubarak. Decidimos hoje [ontem] enviar uma carta aos militares em nome de todas as forças políticas do Egito expondo as nossas demandas.
(…)
Como vê os temores de que a Irmandade Muçulmana tem planos de transformar o país numa teocracia?
Mubarak espalhou essa ficção, de que depois dele viria o caos. É um grupo religioso conservador, mas não acho que eles estejam interessados em tomar o poder. E, mesmo se quiserem, terão que fazer isso nos parâmetros da nova Constituição.
O Brasil errou nos últimos anos ao se aproximar de ditaduras como a de Mubarak em nome da solidariedade de país em desenvolvimento?
Eu gostaria que Brasil, África do Sul, Índia e outros tivessem falado mais alto que o Egito, apesar de também ser um país em desenvolvimento, não tem o direito de torturar seu povo e privá-lo de liberdade política. Governos como o do Brasil têm que entender que perderão credibilidade se não defenderem esses valores universais. Aqui
Por Reinaldo Azevedo

0 comentários:

Postar um comentário