segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

A economia do mundo real



Presidente Executivo do CIEEP
Em inglês, há duas palavras, ambas traduzidas para o português como “economia”: economics, que designa a Teoria Econômica e economy, que se refere à economia do mundo real. O que a maioria dos economistas parece ignorar é que o principal papel da teoria é tentar explicar e entender da melhor forma possível a realidade.
Em notável artigo escrito nos anos 40, The Use of Knowledge in Society, o Prof. Hayek examinou exaustivamente que tipo de conhecimento é adequado para ser utilizado como referencial teórico para as ciências sociais, em geral, e para a economia, em particular. Naquele trabalho, o notável economista austríaco faz notar, com a acuidade que lhe era peculiar, que o conhecimento que os agentes econômicos e sociais possuem apresenta duas características: a primeira é que ele é sempre incompleto e insuficiente, para que possam tomar decisões com absoluta certeza e a segunda é que ele se encontra disperso, isto é, desigualmente distribuído, cada agente detendo uma fração particular do total de conhecimento diferente das frações possuídas pelos demais. Ora, como a economia do mundo real (economy) é um processo de escolhas, em que cada agente toma decisões julgando, a priori, que estas serão as melhores no sentido de aumentar a sua satisfação, e como essas escolhas – que os economistas austríacos chamam simplesmente de “ação” – se dão ao longo do tempo bergsoniano, que nada mais é do que um suceder permanente de novas experiências, segue que as decisões tomadas no mundo da economia sempre se caracterizam pela existência de uma incerteza dita “genuína”, ou seja, não sujeita à teoria bayesiana das probabilidades, em que se constroem distribuições associando cada um dos eventos possíveis a números.
Outra característica da economia do mundo real ressaltada por Hayek – e que muitos economistas deixam de considerar – é que há dois tipos de conhecimento, o científico (digamos, o dos formuladores das políticas públicas) e o prático, por ele denominado de “conhecimento das circunstâncias de tempo e lugar”. Por exemplo, um professor de Economia, como o autor deste artigo, possui um estoque teórico de conhecimentos que tenta aplicar para analisar os fenômenos do mundo real, mas que é necessariamente diferente do estoque de conhecimentos de seu amigo Antonio Paura, um jornaleiro que, já de madrugada, sabe perfeitamente como encadernar os jornais e arrumar as revistas em sua banca.
Qual a importância disto? Bem, se me colocarem, às quatro horas da manhã, para encadernar jornais, eu não saberei nem como começar, mesmo descontando o efeito do sono; da mesma forma, se colocarem o paesano Antonio para dar uma aula de Economia Monetária, sucederá com ele o mesmo, embora, sendo um homem inteligente e com a experiência de vida que acumulou, poderá dar palpites muito menos escabrosos do que os de alguns economistas e articulistas. Se o conhecimento detido pelos cientistas ou planejadores fosse o mesmo que o dos homens práticos, o planejamento econômico centralizado e as políticas públicas poderiam conduzir a resultados desejados pelos formuladores das políticas, mas, como apenas uma parcela pequena do conhecimento de ambos forma uma interseção (por exemplo, tanto eu como o Paura sabemos que as notícias sobre o nosso Fluminense estão no caderno de esportes do jornal), todo e qualquer planejamento centralizado está fadado ao fracasso. Na antiga União Soviética, por exemplo, era comum faltarem sapatos de um determinado número durante meses, porque os planejadores que determinavam quantos pares de cada tamanho seriam produzidos eram inteiramente alheios ao mercado de sapatos. Nós, economistas, precisamos dar mais atenção à economia do mundo real, que é a que importa, e usar a Teoria Econômica apenas para que todos possam entendê-lo melhor.

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