segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

VISÃO GERAL DOS DOCUMENTOS DA IGREJA SOBRE OS BENS CULTURAIS DA IGREJA



A missão da Igreja Católica de levar a evangelização a todos os povos não pode prescindir, como é claro, dos séculos de um caminhar que exigiram bens materiais e espirituais, bens culturais que fornecem a base de toda sua presença no mundo de hoje como no de ontem.
Sentimos que no universo de seus bens culturais estão compreendidos os que sintetizou a CNBB: os bens (móveis e imóveis), “arquitetura, escultura, pintura, mobiliário e artes decorativas e, alem destes, os livros e documentos escritos”. Acrescentando ainda: “Estes bens pertencem à comunidade cristã e são patrimônio universal dos homens e portanto, são inalienáveis” (1).
Não se pense apenas nos bens culturais que nos foram legados pelos nossos antepassados, mas pensemos também naqueles bens que estaremos legando aos nossos filhos e netos. Assim, não é só o passado histórico e artístico que devem ser alvo de nossas preocupações, senão também aqueles bens que estamos criando para uso atual da Igreja, que deverão permanecer pelos séculos futuros como testemunhos de nosso agir para obter a participação, cada vez mais profunda, dos cristãos nos sagrados mistérios do Senhor.
Se “aos Bispos compete promover uma arte autenticamente sagrada” como preconiza a Sacrosanctum Concilium (2), “os clérigos, durante o curso filosófico e teológico, sejam também instruídos na história da Arte Sacra e de sua evolução, bem como acerca dos sãos princípios que devem reger as obras de arte, de tal forma que apreciem e conservem os veneráveis monumentos da Igreja e possam orientar os artistas na produção de suas obras”.(3).
Recomenda o Código de Direito Canônico: “Os leigos que são destinados permanentemente ou temporariamente a um serviço especial da Igreja, têm a obrigação de adquirir a formação adequada, requerida para o cumprimento do próprio encargo e para exercê-lo consciente, dedicada e diligentemente” (4).
Cumpre ainda lembrar a insistência com que a Igreja lembra da necessidade da existência, em cada diocese, da Comissão de Arte Sacra (5).
1. As Igrejas novas.
“A Igreja sente-se preocupada com as novas construções que, longe de mostrarem novos caminhos que representassem em espaços físicos as profundas transformações por que passam, muito pelo contrário na sua grande maioria se prende aos velhos estilos ou ainda que, pretensiosamente modernas, são de um mau gosto que prejudicam a imagem real da Igreja.
A Igreja firmou uma nova aliança com o artista de hoje pela promulgação da Constituição sobre a Sagrada Liturgia do Concílio Vaticano II – diz Paulo VI – este pacto visa à reconciliação e renascimento da arte religiosa”. (6).
"Cumpre que se persuadam os reitores de igrejas que a melhor despesa na construção de um edifício é a que concerne ao projeto, à planta. Chamem um bom arquiteto e não tenham excessiva confiança em peritos ou empreiteiros experientes". (7).
Compete às Comissões Diocesanas de Arte Sacra ou Bens Culturais, “examinar os planos e projetos de construção de novas igrejas ou lugares de culto”, alem de “promover o gosto e o sentido artístico do clero e do povo de Deus por meio de cursos, conferências e diretivas diocesanas, como também exposições, encontros e simpósios”. (8).
“... nossas igrejas e também os outros lugares onde se celebra o culto, devem recorrer à arte e ao bom gosto para criar um ambiente religioso digno, cômodo, funcional e simples, sem ser banal” (9).
Por outro lado, “na construção das igrejas tenha-se grande cuidado para que sejam funcionais quer para a celebração das ações litúrgicas, quer para obter a participação ativa dos fiéis”. (10).
“Para corresponder às necessidades de nossa época, a organização da igreja e de suas dependências requer que não se tenha em vista apenas o que se refere às ações sagradas, mas também tudo o que contribua para uma justa comodidade dos fiéis, como se costuma providenciar nos lugares onde se realizam reuniões” (11).
Eis porque, caberá ao arquiteto elaborar o projeto, dentro dos melhores princípios de projetação, obedecidas as necessárias recomendações no que tange não só aos diversos espaços necessários à celebração, senão também à comodidade dos fieis, a boa acústica e aeração, senão também à efetiva participação dos fieis.
2. As igrejas existentes, Adaptação de uso.
Em nosso país, em qualquer lugar que se ande, deparamos freqüentemente com aqueles bens pertencentes à Igreja Católica que merecem nossa especial atenção pelos seus aspectos artísticos e históricos.
Ai estão incluídos não somente as edificações religiosas senão também todos aqueles componentes decorativos ou necessários ao culto, como as alfaias e, mais ainda, todos aqueles testemunhos da fé de nosso povo. Muitos deles, que inicialmente podemos atribuir-lhe menor valor, por alguma circunstância podem se tornar de valor incalculável aos olhos dos especialistas.
A Igreja, é justo reconhecer, tem procurado criar novas obras de arte que representem sua época, que se mostrem dignas do espírito inventivo de seus filhos e sua fé, mas também procurado preservar, da melhor forma possível aqueles bens que lhe foram concedidos pelo Senhor.
Muito antes da criação dos diversos órgãos públicos de preservação do patrimônio histórico e artístico, já com carinho mantinha, a Igreja, todos estes edifícios ou bens devidamente protegidos e conservados. Longe iríamos se quizessemos registrar a proteção recomendada pelo magistério da Igreja. Lembremos rapidamente, Pio II em 1467 com sua Bula “Cum alma urbem”, Pio III em 1556, Pio V em 1572, Gregório XIII em 1580 e muitos outros, com seus escritos e normas. No Brasil lembraríamos o Decreto Consistorial de 1909, as Constituições Eclesiásticas de 1915 e a Pastoral dos Bispos Mineiros de 1926. No entanto, temos a lamentar um passado perdido por motivos os mais variados.
O Concilio Ecumênico Vaticano II, como primícias de seu trabalho, promulgou a “Sacrosanctum Concilium”, à qual seguiram outros vários documentos.
Devemos buscar não somente nos documentos específicos sobre os bens culturais, mas em outros vários documentos que trazem em seu correr orientações importantes referentes aos vários aspectos da arte sacra e de seus bens a preservar.
Criada a Pontifícia Comissão para a Conservação do Patrimônio Artístico e Histórico da Igreja, o Motu Próprio “Inde a Pontificatus Nostri Initio” a transforma da Pontifícia Comissão para os Bens Culturais da Igreja.
Desejamos lembrar algumas das mais importantes passagens de documentos do Magistério da Igreja sobre seus bens culturais.
“Para edificar, reformar e dispor convenientemente os edifícios sagrados, consultem os responsáveis a Comissão Diocesana de Liturgia e Arte Sacra. O Bispo diocesano recorra também ao parecer e auxílio da mesma Comissão, quando se tratar de estabelecer normas nesta matéria, de aprovar projetos de novos edifícios ou resolver questões de certa importância”. (12).
“Contudo, nas igrejas já construídas, quando o altar
antigo estiver colocado de tal maneira que torne difícil a participação do povo, nem puder ser transferido sem detrimento de seu valor artístico, construa-se outro altar fixo com valor artístico, a ser devidamente dedicado; e somente nele se realizem as sagradas celebrações. Para não distrair a atenção dos fieis do novo altar, o altar antigo não seja ornado de modo especial”. (13).
“A reforma litúrgica, que tanto bem tem feito ao povo cristão quando aplicada com prudência e critério, algumas vezes por atitudes abusivas tem dado motivo a tristezas: - dispor de bens artísticos pela troca ou venda; - interpretação não equilibrada, provocando a mudança de espaço arquitetônico original; - empobrecimento dos templos antigos com a retirada de objetos de valor artístico, substituídos por uma simplicidade pobre ou de mau gosto” (14).
“Dado que as obras de arte e os tesouros que chegaram até nós do passado devem ser adaptados às disposições litúrgicas(15), procurem os Bispos que isto seja feito somente em caso de verdadeira necessidade e sem causar dano às próprias obras (16).
3. Os bens culturais.
“Os fieis, porem, mostram-se preocupados por verem, hoje mais que no passado, tantas alienações indevidas, furtos, usurpações e destruições do patrimônio histórico-artístico da Igreja“ (16).
“Os bens culturais da Igreja constituem uma das mais elevadas expressões da tradição cristã, originaria das inumeráveis gerações de crentes e representam uma parte essencial da herança cultural da humanidade.
Estas são, de fato, manifestações de Deus junto ao homem e elevação do homem para Deus e constituem testemunhos da identidade e da tradição histórica dos povos.
A comunidade católica e a comunidade civil devem por isso sentir a grave responsabilidade de conhecer, guardar valorizar e transmitir às gerações futuras toda a preciosa herança que lhe
foi temporariamente confiada.
A Igreja Católica, em particular, deve considerar os bens culturais religiosos como fonte primaria da sua atividade pastoral para a reevangelização do mundo contemporâneo.
A ação da Igreja para a guarda e valorização dos bens culturais religiosos móveis e imóveis é particularmente urgente no atual momento histórico, ...” (17).
Conforme acima já assinalamos, compreendem não somente os bens imóveis senão também todos aqueles enumerados pela CNBB, que acrescenta: “Estes bens também não podem ser demolidos, mutilados, removidos, modificados, nem restaurados sem autorização da autoridade competente (o Bispo e a comissão diocesana) e, se tombados como monumento nacional ou estadual do órgão nacional ou estadual competente (Dec. Lei n.º 25 de 30/XI/37)”.
Grande é o número de recomendações e normas emanadas do Magistério da Igreja, das quais daremos notícia mais detalhada em nosso próximo encontro.

Ivo Porto de Menezes

(1) Documento-base sobre a Arte Sacra, CNBB, Comunicado mensal n.º 227, item 2. 1, letra a, pág. 137.
(2) Sacrosanctum Concilium, n. 124.
(3) Sacrosanctum Concilium, n.º 129.
(4) Código de Direito Canônico, Cânon 231 § 1.º
(5) Sacrosanctum Concilium, n. 46, 126; Instrução geral sobre o Missal Romano, n. 291;
(6) CNBB – Documento-base sobre a Arte Sacra, n.1.6.
(7) Cardeal Celso Constantini, A propósito da Instrução do Santo Ofício sobre a Arte Sacra, p. 30
(8) CNBB – Documento-base sobre a Arte Sacra, n. 2. 2, letra ª
(9)CNBB – Animação da vida litúrgica no Brasil. Documento n. 43.
(10) Sacrosanctum Concilium, n. 124.
(11) Instrução Geral sobre o Missal Romano, n. 293.
(12) Instrução Geral sobre o Missal Romano, n. 291
(13) Instrução Geral sobre o Missal Romano, n. 303.
(14) CNBB – Documento-base sobre a Arte Sacra, n. 1.5.
(15) Instrução Geral sobre o Missal Romano, n. 254.
(16) De cura patrimonii historico-artistici Ecclesiae, ad Praesides Conferentiarum Episcopalium, Acta Apostolicae Sedis, vol. LXIII, 1971, pág. 315.
(17) Sulla Tutela dei beni culturali della Chiesa, Carta di Villa Vigoni, 1994, Pontificia Comissão dos Bens Culturais da Igreja.
 

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