segunda-feira, 15 de novembro de 2010

O Fato e seu contexto A Fraude do "Código Da Vinci": Um best-seller mentiroso

Por: Pablo J. Ginés Rodríguez 08/01/2004
O Código Da Vinci é uma novela de ficção anticatólica que está sendo um êxito de vendas em todo o mundo. Com mais de 30 milhões de exemplares vendidos, traduzida em 30 idiomas e com os direitos para transformá-la em filme vendidos à Columbia Pictures e ao diretor Ron Howard (com Russell Crowe como ator principal) trata-se já de um acontecimento próprio da cultura de massas. Os protagonistas se vêem envoltos em um thriller de aventura, decifrando a simbologia secreta na pintura do Leonardo Da Vinci. E a mensagem que transmite a novela é basicamente a seguinte:
1.. Jesus não é Deus: nenhum cristão pensava que Jesus fosse Deus até que o imperador Constantino o considerou como Deus no concílio da Nicéia, em 325.
2.. Jesus teve como companheira sexual Maria Madalena; seus filhos, portadores de seu sangue, representam o Santo Graal (sangue de rei = sangue real = Santo Graal), fundadores da dinastia Merovíngia na França (e antepassados da protagonista da novela).
3.. Jesus e Maria Madalena representavam a dualidade masculino-feminina (como Marte e Ateneu, Isis e Osíris); os primeiros seguidores de Jesus adoravam "o sagrado feminino"; esta adoração ao feminino está oculta nas catedrais construídas pelos Templários, na secreta Ordem do Priorado de Sion -a qual pertencia Leonardo Da Vinci- e em mais de mil códigos culturais secretos.
4.. A maligna Igreja Católica inventada por Constantino que, em 325, perseguiu os tolerantes e pacíficos adoradores do feminino, matando milhões de bruxas na Idade Média e no Renascimento, destruindo todos os evangelhos gnósticos dos quais não gostavam e preservando apenas os quatro evangelhos que melhor lhe convinha. Na novela, o maquiavélico Opus Dei trata de impedir que os heróis revelem o segredo: que o Graal representa os filhos de Jesus e Madalena e que o primeiro deus dos "cristãos" gnósticos era feminino.
Tudo isto não é vendido como uma crônica, novela ou história de ficção em relação a um passado alternativo, a uma Europa imaginária. Tenta-se comercializar como erudição, pesquisa histórica e trabalho sério de documentação.
Em uma nota no princípio do livro, o autor, Dan Brown, declara: "todas as descrições de arte, arquitetura, documentos e rituais secretos nesta novela são fidedignas". Como veremos, isto é falso: os enganos, as invenções, as tergiversações e os simples boatos abundam por toda a novela. A pretensão de erudição cai ao chão ao se revisar a bibliografia que usou: os livros “sérios” de história ou de arte escasseiam na biblioteca do Brown, e brilham em troca as paraciências, os esoterismos e as pseudo-histórias conspirativas.
Mas isso não impediu à imprensa de elogiar o "trabalho histórico" que permeia o livro. Por exemplo, o Chicago Tribune maravilhou-se por considerar que o livro contém uma "história” fascinante e documentada que equivale a vários doutorados"; o New York Daily News mencionou uma "pesquisa impecável"; o crítico do Jornal da Catalunha (12/12/03), Ramón Ventura, disse que "entender a novela como um panfleto anticristão é não entender que se trata de um relato de aventuras pouco conhecidas da história, onde se combinam os mistérios da religião com os enigmas da arte; Dan Brown escreve com a paixão e a erudição de Matilde Asensi em seu último livro de verbetes.
A editora do livro na Espanha, Aránzazu Sumalla, que encontrou uma mina de ouro para a sua pequena editoria Umbriel (O Código Da Vinci vende 2.400 livros por dia na Espanha, 125.000 nos primeiros 50 dias), não entende que na página Web do Opus Dei se critique negativamente o livro, que apresenta o Opus como uma seita destrutiva disposta ao assassinato e outras técnicas imaginárias, com o detalhe de que o assassino Silas faz parte da “corporação” e usa o cilício. Segundo a editora "trata-se de uma obra de ficção". Mas Dan Brown, em sua própria página Web, diz bem claro que não escreveu só uma novela cheia de despropósitos para divertir: "Como comentei antes, o segredo que revelo foi sussurrado durante séculos. Não é meu. É certo que pode ser a primeira ocasião em que o segredo se desvela com o formato de um thriller popular, mas a informação não é nova. Minha sincera esperança é que O Código da Vinci, além de entreter as pessoas, sirva como uma porta aberta para que comecem suas pesquisas".
O resultado é que as vendas de livros pseudo-históricos sobre a Igreja, os evangelhos gnósticos, a mulher no cristianismo, as deusas pagãs, etc. dispararam. A livraria eletrônica Amazon.com é a primeira beneficiada, combinando O Código da Vinci com livros de pseudo-história neopagã, de feminismo radical e de new age. A ficção é a melhor forma de educar as massas, sendo que, disfarçada de ciência (história da arte e das religiões neste caso), engana melhor os leitores. Como afirma o ditado: "Calunie, porque algo fica, e se caluniares com dados que soem como científicos – embora inventados – fica mais”.
Constantino inventou o cristianismo?
Toda a base "histórica" de Brown repousa sobre uma data: o concílio de Nicéia do ano 325. Segundo suas teses, antes desta data o cristianismo era um movimento muito aberto, que aceitava "o divino feminino", que não via Jesus como Deus, conforme estava escrito em muitos ‘evangelhos’.
Neste ano, de repente, o imperador Constantino, um adorador do culto -masculino- ao Sol, se apoderou do cristianismo, desterrou "a deusa", converteu o profeta Jesus em um herói-deus solar e , ao modo stalinista, fez desaparecer os evangelhos dos quais não gostava.
Para qualquer leitor com um pouco de cultura histórica esta hipótese é absurda, ao menos por duas razões:
1.. Há textos que demonstram que o cristianismo antes de 325 não era como considera a novela e que os textos gnósticos eram tão alheios aos cristãos como atualmente são as publicações "new age": parasitárias e externas.
2.. Ainda que Constantino almejasse mudar a fé de milhões, como poderia obter êxito em um concílio que contava com a presença de milhões de cristãos e também de centenas de bispos? Muitos dos bispos de Nicéia eram veteranos que sobreviveram às perseguições de Diocleciano, e levavam em seu corpo as marcas da prisão, da tortura ou dos trabalhos forçados por manter sua fé. Iriam deixar que um imperador mudasse sua fé? Acaso não era essa a causa das perseguições desde Nero: a resistência cristã contra serem assimilados como um culto a mais? De fato, se o cristianismo antes de 325 tivesse sido como o descrevem os personagens de Brown e muitos neognósticos atuais, nunca teria sofrido perseguição, já que estaria alinhado perfeitamente com tantas outras opções pagãs. O cristianismo foi sempre perseguido por não aceitar as imposições religiosas do poder político e proclamar que só Cristo é Deus, com o Pai e o Espírito Santo.
Jesus é Deus?
Na novela, o personagem do historiador inglês Teabing afirma que na Nicéia se estabeleceu que Jesus era "o Filho de Deus". Um reexame dos evangelhos canônicos, escritos quase 250 anos antes de Nicéia, apresenta 40 menções a Jesus como Filho de Deus. O que Brown está fazendo é copiar de um dos livros pseudo-históricos que mais plagiou para fazer seu best-seller, “Holy Blood,Holy Grial” no qual se afirma que "em Nicéia se decidiu por votação que Jesus era um deus, não um profeta mortal".
A verdade é outra. Os cristãos sempre pensaram que Jesus é Deus e é desse modo que figura nos evangelhos e em escritos cristãos muito anteriores a Nicéia. Por exemplo, e para desgosto de mórmons, Testemunhas de Jeová ou muçulmanos (três credos atuais que negam que Jesus seja Deus) podemos ler o que Tomé diz ao ver Jesus ressuscitado:
[João 20,28] Ho Kurios mou ho Theos mou (Meu Senhor e meu Deus)
Ou em Romanos 9,5; carta ditada por São Paulo a Tércio em casa de Gayo, em Corinto, no inverno de 57-58 d.C:
"deles (dos judeus) descende Cristo, segundo a carne, o qual é, sobre todas as coisas, Deus bendito para sempre".
Ou em Tito 2,13:
" na expectativa da nossa esperança feliz, a aparição gloriosa de nosso grande Deus e Salvador, Jesus Cristo ".
Ou em 2Pedro1,1:
" Simão Pedro, servo e apóstolo de Jesus Cristo, àqueles que, pela justiça do nosso Deus e do Salvador Jesus Cristo, alcançaram por partilha uma fé tão preciosa como a nossa ".
E fora dos evangelhos há os textos de Padres da Igreja muito anteriores a Nicéia:
"Pois nosso Deus, Jesus Cristo, foi, segundo o desígnio de Deus, concebido no ventre de Maria, da estirpe de Davi, mas pela ação do Espírito Santo" [Carta aos Efésios de Santo Inácio do Antioquia, c.35-C.107 d.C].
"Se tivesse entendido o escrito pelos profetas, não teria negado que Ele [Jesus] era Deus, Filho do único, incriado, insuperável Deus" [Diálogo com o Trifón, São Justino Mártir, c.100-C.165 d.C].
"Ele [Jesus Cristo] é o santo Senhor, o Maravilhoso, o Conselheiro, o Formoso na aparência, e o Poderoso Deus, vindo sobre as nuvens como juiz de todos os homens" [Contra os hereges, livro 3, São Irineu de Lyon, C. 130 -200 d.C].
"Só Ele [Jesus] é tanto Deus como Homem, e a fonte de todas as nossas coisas boas" [Exortação aos gregos, de São Clemente de Alexandria, 190 d.C].
"Só Deus está sem pecado. O único homem sem pecado é Cristo, porque Cristo também é Deus" [A alma 41:3, pelo Tertuliano, ano 210 d.C].
"Embora [o Filho] fosse Deus, tomou carne; e tendo sido feito homem, permaneceu como era: Deus" [As doutrinas fundamentais 1:0:4; por Orígenes, c.185-C.254 D.C.].
Estas citações -e muitas outras- demonstram que os cristãos tinham como clara a divindade de Cristo muito antes de Nicéia. De fato, em Nicéia o debate era sobre os ensinamentos de Ário, um sacerdote herético da Alexandria que em 319 ensinava que Jesus não era Deus, mas um deus menor. De 250 bispos, só dois votaram a favor da postura de Ário, enquanto que o resto afirmou o que hoje se recita no Credo, que o Filho de Deus foi gerado, não criado e que é da mesma natureza (substância, homoousios¹) que o Pai. Ou seja, que Deus Filho é Deus, igual a Deus Pai, também Deus; são um mesmo Deus, porém em distintas Pessoas. Em que pese esta unanimidade dos padres conciliares, o historiador Teabing na novela diz que Cristo foi "designado Deus" por uma estreita margem de votos!
Um historiador que não sabe história
Teabing também diz uma série de coisas sobre como o cristianismo inventado por Constantino não era mais que paganismo. "Nada no Cristianismo é original", diz o personagem. Escrevemos sublinhadas as afirmações do Código da Vinci e a seguir comentamos cada uma.
- Os discos solares egípcios se converteram em halos (auréolas) de Santos católicos.
A arte cristã tem que expressar conceitos bíblicos, como as caras luminosas de Moisés (no Sinai) e Jesus (na Transfiguração).
Para isso, usam um recurso comum, os halos ou nimbos que já usavam a arte grega e a romana. Os imperadores romanos, por exemplo, aparecem nas moedas com cabeças radiantes.
- Os pictogramas de Isis amamentando o milagroso bebê Horus foram o modelo para as imagens da Virgem Maria com o Menino Jesus.
A imagem de uma mãe amamentando é comum nos egípcios, nos romanos, astecas ou qualquer outra cultura que represente a maternidade. Isis, nos primeiros séculos de nossa era, já não era uma deusa popular da agricultura egípcia, e sim um culto enigmático de tipo iniciátório para elites greco-romanas, culto que, por certo, não incluía rituais sexuais que tanto agradam ao autor. Os artistas cristãos, na hora de representar Maria junto a Jesus (uma mãe com um menino), usaram os modelos artísticos da sociedade da qual faziam parte.
-"A mitra, o altar, a doxologia e a comunhão, o ato de comer Deus, foram tomados diretamente de religiões enigmáticas pagãs anteriores.”
A mitra dos bispos dificilmente pode estar inspirada em religiões enigmáticas antigas: não aparece no Ocidente até meados do século X, e no Oriente não se usa até a queda de Constantinopla, em 1453.
O altar é –como o próprio cristianismo– de origem judia, não pagã. Há 300 referências a altares no Antigo Testamento. O altar dos sacrifícios do Templo de Jerusalém é o ponto de referência do judaísmo antigo e do simbolismo cristão. Nada a ver com cultos pagãos.
A Doxologia (doxa=glória; logos=palavra) não é mais do que a oração do Glória: "Glória a Deus nas alturas e na terra paz aos homens; louvamos-Te, bendizemos-Te, adoramos-Te." Usa, pois, linguagem puramente cristã, com conceitos trinitários, e utilizando continuamente passagens do Novo Testamento. Nada a ver com cultos enigmáticos pagãos.
A comunhão e "comer Deus": parece que nos níveis superiores do culto a Mithras existia uma ceia sagrada de pão e água ou pão e vinho. Não há dados que indiquem que os mitraístas considerassem que nessa ceia "comiam um deus" nem nada similar. De novo, a origem de benzer e compartilhar o pão é judia, como explica com detalhe Jean Danielou em sua obra, A Bíblia e a liturgia. Parece que Jesus instituiu a Eucaristia cristã durante uma chabourá, uma refeição sagrada judia. Não há relação com cultos enigmáticos pagãos.
- O domingo, dia sagrado cristão, foi roubado aos pagãos
Falso. Desde o começo, os cristãos viram o dia depois do Sabbath, quer dizer, o primeiro dia de cada semana, como o mais importante, dia de sua reunião. Já o faziam em época de São Paulo (ver At 20,7: " no primeiro dia da semana, estando nós reunidos para partir o pão", ou 1 Cor 16,2, quando Paulo pede para reunirem as coletas e dízimos no primeiro dia da semana). Danielou, em A Bíblia e a Liturgia, dedica todo o seu capítulo 16 a falar do "Oitavo dia", com citações de Inácio de Antioquia, da Epístola de Barnabé, da Didaqué, todos autores de fins do século I e princípios do séc. II Todos falam do "dies domenica" (dia do Senhor). São Justino, por volta de 150 d.C. é o primeiro cristão a usar o nome latino de dia do Sol para referir-se ao primeiro dia da semana.
Já no concílio de bispos hispânicos de Elvira, em 303 d.C. se proclamou: "se alguém na cidade não vem à igreja três domingos seguidos será excomungado por um tempo curto, para que se corrija". Só 20 anos depois, em 321, Constantino declara oficialmente o domingo como dia de descanso e abstenção do trabalho. Ou seja, o domingo é um "invento" cristão, posteriormente adotado pela sociedade civil, e não uma festa pagã roubada por cristãos, justamente o contrário do que diz a novela de Brown.
-Também ao deus hindu Krishna, recém-nascido, são oferecidos ouro, incenso e mirra
Extraído, ao que parece, do livro pseudo-histórico The World's Sixteen Crucified Saviours, [Os 16 salvadores do mundo crucificados] escrito por Kersey Graves, em 1875, e rejeitado inclusive por ateus e agnósticos, embora muito popular e copiado na Internet. Graves não fornece nenhuma documentação de suas afirmações. A menção a ouro, incenso e mirra parece simplesmente uma invenção. Na literatura hindu isto não se encontra em nenhum lugar. O Bhagavad-Gita (séc. I d.C.) não menciona a infância da Krishna. Nas histórias sobre o Krishna menino de Harivamsa Purana (c.300 d.C) e de Bhagavata Purana (c.800-900.dC.) tampouco estão presentes.
- O deus Mithras, nascido em 25 de dezembro como Osíris, Adonis e Dionisios, com os títulos "Filho de Deus" e "Luz do Mundo", enterrado na rocha e ressuscitado 3 dias depois, inspiraram muitos elementos do culto cristão.
Na realidade, a festa pagã de 25 de dezembro em Roma foi criada pelo imperador Aurélio em 274, muitos anos após os cristãos latinos terem celebrado 25 de dezembro como data do nascimento de Cristo.
Embora na novela falem de Mithras como um deus "morto, enterrado na rocha e ressuscitado três dias depois", esta afirmação não está presente em nenhum texto nem tradição antiga acerca de Mithras. Ao que parece é outro dos empréstimos tirados do panfleto de Kersey Graves, em concreto do capítulo 19 do The World's Sixteen Crucified Saviours. É obvio que Graves não fornece documentação.
Gnosticismo a serviço do feminismo radical
Por que o mundo vai tão mal, há guerras, violência e contaminação? A resposta do feminismo radical e do Código da Vinci é singela: a culpa é do cristianismo, que é machista:
"Constantino e seus sucessores masculinos converteram com êxito o mundo do paganismo matriarcal até a Cristandade patriarcal mediante uma campanha de propaganda que demonizou o sagrado feminino, eliminando a deusa da religião moderna”. Como conseqüência, "a Mãe Terra se converteu em um mundo de homens, e os deuses da destruição e da guerra impõem seu ônus. O ego masculino mantém-se há dois milênios sem equilibrar-se com sua balança feminina. Uma instabilidade marcada por guerras, alimentadas com testosterona, numa situação excessivamente indesejável de sociedades misóginas e de uma crescente falta de respeito pela Mãe Terra”.
Isto seria evitado se fosse seguido o "cristianismo" gnóstico, conforme alguns grupos e tendências que consideravam o divino como masculino-feminino, em relações harmônicas, inclusive andróginas. Jesus -segundo os gnósticos do séc. II e os newagers feministas do séc. XX- necessita de um oposto feminino que lhe complete; sua consorte seria Maria Madalena. Documentos que o sustentam: os evangelhos apócrifos, textos gnósticos imaginativos sem base histórica.
Enquanto os evangelhos canônicos são do séc. I, nenhum texto gnóstico é anterior ao séc. II. Muitos são do séc. III, IV ou V. Em meados do séc. II a Igreja já tinha claro que os evangelhos de Mateus, Marcos, Lucas e João eram os inspirados pelo Espírito Santo, e só duvidava no cânon de dois ou três textos. É falsa a idéia da novela de que em 325, com Constantino, dentre "mais de 80 evangelhos considerados para o Novo Testamento", só foram escolhidos quatro. Estes quatro já estavam selecionados há mais de 200 anos, como lemos nos textos do Justino Mártir (150 d.C) e de Santo Irineu.
No Código da Vinci há material de muitos tipos: new age, ocultismo, teorias conspiratórias, neopagãos, wiccas, astrologia, empréstimos orientais e ameríndios. Uma salada de fruta cuja base é o coquetel gnóstico-feminista. Há pouca pesquisa verdadeira sobre o Santo Graal, mas muito furto.
Desse modo, nos cita um texto que de fato existe, o Evangelho de Maria Madalena, uma obra gnóstica tardia, escrita por autores de uma seita gnóstica, de fora do cristianismo. Nele, Maria beija na boca de Jesus e isso causa a inveja dos apóstolos. Segundo Teabing, o historiador da novela, "Jesus era o primeiro feminista. Pretendia que o futuro de sua igreja estivesse em mãos de Maria Madalena".
O que ninguém cita é o versículo 114 do famoso texto gnóstico Evangelho de Tomé, onde Jesus diz que Ele fará de Maria Madalena "um espírito vivente que se pareça com vocês, varões. Porque cada mulher que se faça a si mesmo varão entrará no reino dos céus". O gnosticismo antigo é reciclado por antagonistas da Igreja atual, mas para isso necessitam rechaçar alguns aspectos do gnosticismo antigo, que na realidade era machista, elitista, desprezava o corpo e todo o material e é difícil de vender como "o autêntico cristianismo".
Assim, o entusiasmo do autor pelos "ritos de fertilidade", que tanto admiram -e praticam- os protagonistas, não tem nada a ver com a fertilidade, obviamente, e sim com o prazer sexual.. É um sinal dos tempos, mas também uma pura herança gnóstica: gerar, dar vida a novos corpos é mau. Justo o contrário do que prega o cristianismo! Sexo sem concepção. Pode-se supor que a próxima novela trate de clonagem, quer dizer, de concepção sem sexo.
Outros muitos enganos
Sandra Miesel, uma jornalista católica especializada em literatura moderna popular, não pôde deixar de fazer uma lista da miscelânea de erros do livro, como, por exemplo, com relação a sua "impecável" documentação.
a. Diz-se que o planeta Vênus se move desenhando um pentagrama, o chamado "pentagrama do Ishtar", simbolizando a deusa (Ishtar é Astarté ou Afrodite). Ao contrário do que diz o livro, a figura não é perfeita e não tem nada a ver com as Olimpíadas. As Olimpíadas são celebradas a cada quatro anos e em honra de Zeus, nada a ver com os ciclos de Vênus nem com a deusa Afrodite.
b. O novelista diz que os cinco anéis das olimpíadas são um símbolo secreto da deusa; a realidade é que quando se organizaram as primeiras olimpíadas modernas o plano era começar com um e ir acrescentando um anel em cada edição, mas ficaram em cinco.
c. Na novela apresentam-se a larga nave e o vão central de uma catedral como um tributo secreto ao ventre feminino, com as nervuras como pregas sexuais, etc. Isto foi tirado do livro de pseudo-história “The Templar Revelation”, onde se afirma que os templários criaram as catedrais. É obvio que é falso: as catedrais foram encarregadas pelos bispos e seus cônegos, não aos templários. O modelo das catedrais era a igreja do Santo Sepulcro ou as antigas basílicas romanas, edifícios retangulares de uso civil.
d. O Priorado de Sion realmente existe, é uma associação francesa registrada desde 1956, possivelmente originada depois da II Guerra Mundial, embora clamem ser herdeiros de maçons, templários, egípcios, etc. É incrível a lista de Grandes Mestres fornecida pela novela: Leonardo Da Vinci, Isaac Newton, Victor Hugo.
e. A novela diz que o tetragramaton YHWH, o nome de Deus em hebraico, vem de Jehová, uma união física andrógina entre o masculino Jah e o nome pré-hebreu de Eva, Havah". Ao que parece, ninguém explicou a Brown que YHWH (que hoje sabemos que se pronuncia Iahwé) começou a pronunciar-se "Jeová" na Idade Média ao interpolar-se entre as consoantes as vogais de "Adonai".
f. As cartas do tarot não ensinam doutrina da deusa; foram inventadas para jogos de azar no séc..XV e não adquiriram associações esotéricas até finais do séc. XVIII. A idéia de que os diamantes do baralho francês representam pentáculos é uma invenção do ocultista britânico A.E. Waite. O que dirão os esotéricos do baralho espanhol com suas copas -símbolos sexuais femininos- e suas espadas -símbolos fálicos, possivelmente como os paus-?
g. O Papa Clemente V não eliminou os templários em um plano maquiavélico nem jogou suas cinzas no Tíber, que está em Roma. Pois Clemente V foi o primeiro papa em Avignon. Toda a iniciativa contra os templários foi do rei francês Felipe, o Formoso. Maçons, nazistas e agora os neognósticos querem ser os herdeiros dos templários.
h. Mona Lisa não representa um ser andrógino, mas a Madonna Lisa, esposa de Francesco de Bartolomeu do Giocondo. Mona Lisa não é um anagrama dos deuses egípcios Amón e ISA (Isis).
i. Na Último Última Ceia de Leonardo, não aparece o cálice e aparece o jovem e elegante São João, o discípulo amado. A novela diz que o jovem bonito na realidade é Maria Madalena, que ela é o Graal. A verdade é que não aparece o cálice porque o quadro está descrevendo a Última Ceia tal como descrita no Evangelho de São João, sem a instituição da Eucaristia, mais concretamente quando Jesus avisa que "um de vós me trairá" (João 13,21).
j. A novela fala que Leonardo recebeu muitos encargos da Igreja e "centenas de lucrativas comissões vaticanas". Na realidade Leonardo passou pouco tempo em Roma e apenas lhe deram algum encargo.
k. A novela apresenta o Leonardo como um homossexual ostentoso. Na realidade, embora em sua juventude tenha sido acusado de sodomia, sua orientação sexual não está de todo clara.
l. A heroína, Sophie Neveu, usa o quadro de Leonardo “A Madonna das Rochas” como um escudo e o aperta tanto a seu corpo que se dobra: é assombroso, porque se trata de uma pintura sobre madeira, não sobre tecido, e de quase dois metros de altura.
m. Segundo os protagonistas da novela, "durante trezentos anos a Igreja queimou na estaca a assombrosa cifra de cinco milhões de mulheres". Esta é uma cifra repetida na literatura neopagã, como a da wiccas, da new age e a do feminismo radical, embora em outras webs e textos de bruxaria atual se fale de 9 milhões. Os neopagãos necessitam de uma "shoah" própria.
Quando consultamos historiadores sérios vemos que se calcula que entre 1400 e 1800 foram executadas na Europa cerca de 30.000 a 80.000 pessoas por bruxaria.
Nem todas foram queimadas. Nem todas eram mulheres. E a maioria não morreu pelas mãos de oficiais da Igreja, nem sequer de católicos. A maioria das vítimas vincula-se à Alemanha, coincidindo com as guerras camponesas e protestantes dos séc. XVI e XVII. Quando uma região trocava de denominação, abundavam as acusações de bruxaria e a histeria coletiva. Os tribunais civis, locais e municipais eram especialmente entusiastas, sobretudo nas zonas calvinistas e luteranas. De qualquer forma, a bruxaria foi perseguida e castigada com a morte por egípcios, gregos, romanos, vikings, etc... O paganismo sempre matou bruxos e bruxas. A idéia do neopaganismo feminista de que a bruxaria era uma religião feminista pré-cristã não tem base histórica.
Poder-se-ia continuar dissecando os erros e os simples enganos deste best-seller mentiroso. Para não falar de sua qualidade literária. Mas vale a pena tanto esforço por uma novela? A resposta é sim: para milhares de jovens e adultos, esta novela será seu primeiro, possivelmente único contato com a história antiga da Igreja, uma história regada pelo sangue dos mártires e a tinta de evangelistas, apologetas, filósofos e Padres. Não seria digno dos cristãos do séc. XXI ceder sem luta nem resposta ao neopaganismo o espaço que os cristãos dos primeiros séculos ganharam com sua fidelidade comprometida com Jesus Cristo.
Notas do autor:
Para este artigo utilizei muito material de Carl Orlson, um dos responsáveis pela magnífica página www.envoymagazine.com
Aos leitores da língua inglesa recomendo visitar http:/www.envoymagazine.com e todos os seus links sobre as relações entre cristianismo, gnosticismo e paganismo.
Fonte:
E-cristians.net - 09 / 01 / 03 -
(http://www.e-cristians.net/listados/marcos.asp?ide=5513&cat=hecho&lan=esp)
Artigo publicado em Info - Spes
Boletim Informativo da Fundação S.P.E.S.
Nº 61 - Janeiro de 2003
Cortesia de: José María Baamonde
E-mail: infospes@yahoo.es

0 comentários:

Postar um comentário